Era uma vez um mundo tão próximo...tão longe
Fui ao cinema. Além do novo Batman, também assisti a Era uma vez..., novo filme de Breno Silveira, o mesmo diretor do maior sucesso de bilheteria nacional, "Dois filhos de Francisco". O filme é bom e é ruim. Bom porque escancara toda a podridão da conivência das "autoridades" policiais com o tráfico de drogas dos morros cariocas. Ruim porque não é novidade. Bom porque, como disse Zuenir Ventura no Estadão de ontem, demonstra que "o carioca das classes médias persiste, intimamente, no sonho de 'solução final'. Sonha com o Exército que sobe, a polícia que atira e o confronto que consumará o fim. Não é por maldade ou patologia. É por medo e insegurança". Ruim porque o faz de maneira muito esquemática, didática ao extremo. Bom porque enxerga na cultura uma última - e talvez única - tentativa de unir dois mundos que estão tão distantes estando tão próximos. (A faxineira, o copeiro, o motorista, o balconista da padaria e do açougue, a manicure, o ascensorista, o zelador do prédio, todos empregados na zona sul, moram nos Morros invisíveis). Ruim porque Shakespeare já escreveu "A Tragédia de Romeu e Julieta" de forma original e definitiva, sem possibilitar qualquer condescendência com releituras tupiniquins previsíveis e, pior que o novo Batman, inverossímeis. (É característico, além de esperado e desejável, que os filmes de super-heróis sejam inverossímeis, pois eis a graça). Voltemos a Zuenir. Ele tocou no termo "solução final", que causa arrepios a qualquer pessoa minimamente informada, mas, tal como boa parte da população alemã à epóca de Hitler, tenta justificar a conduta dos cariocas dizendo que o desejo por tal solução não é motivado por maldade, mas por medo. Respondo ao autor de Cidade Partida com os últimos dizeres de Sartre em "A Questão Judaica": Nenhum francês estará em segurança enquanto um judeu, na França e no mundo inteiro, puder temer pela própria vida.
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