Filmar depois de Auschwitz

Acabo de chegar do cinema. Fui assitir a Um homem bom (tradução do original "Good"), filme dirigido pelo brasileiro Vicente Amorim. A trama é baseada na vida de John Halder (Viggo Mortensen), um professor universitário alemão de literatura, ex-combatente da Primeira Grande Guerra, que se torna membro da SS em virtude de um romance que havia escrito defendendo a eutanásia e que atrai a atenção do Terceiro Reich. O filme mostra a antiga amizade entre Halder e o seu psicanalista judeu até o momento da separação deles por razões óbvias. Halder, que não acreditava no "plano alemão" de erradicação dos judeus, só percebe a máquina de destruição e genocídio que Hitler engendrara ao visitar um campo de extermínio na tentativa desesperada de salvar seu amigo. O filme é enfadonho e Mortensen não convence. A sua atuação é fraca e está longe de toda a benevolência que a crítica lhe rendeu. É mais um filme fruto da sociedade imediatista em que vivemos, que acaba por adensar toda a "mensagem" desejada em pouco mais de trinta segundos de película. Não existem mais Bergmans e Fellinis. Definitivamente. Por outro lado, o filme levanta algumas questões interessantes. Seria um romance, um material ficcional, capaz de conferir o status de "especialista" ao seu autor pelo simples fato de ter abordado um tema em particular de maneira aprofundada? Algo como nomear Machado de Assis doutor em psiquiatria pela autoria de "O alienista". Outro aspecto, mote da obra de Amorim, é considerar a possibilidade ABSURDA que um alto oficial da SS desconhecesse o origem humana da nuvem negra exalada pelas chaminés de Auschwitz. Caro Amorim, que Adorno continue reverberando em nossos ouvidos "...Escrever um poema depois de Auschwitz é bárbaro...", assim como é bárbaro que se façam filmes como esse. Pelo menos não agora. Não ainda.