"In memoriam"
A morte recente do filósofo Richard Rorty me entristeceu. Foi um dos poucos pensadores que fazia questão de ser claro em seus textos, fazendo com que o leitor, ainda que em desacordo com as suas idéias, fosse incapaz de abandonar o livro antes de terminá-lo, verdadeira avis rara em meio a estudiosos que prezam e fazem questão do obscurantismo, da inacessibilidade de seus ensaios e discursos. Curioso que sou em relação ao estudo da linguagem, não poderia deixar de dizer que, ao lado de Wittgenstein e, em menor grau, Chomsky, Rorty contribui para o melhor entendimento da estruturação da linguagem, principalmente ao demonstrar que uma idéia só deve ser valorizada se, a partir dela, decorrer uma ação modificadora do pensamento e, em última análise, do mundo. Ele acreditava que uma história de vida, com todas as suas misérias e os seus percalços, era a melhor maneira de despertar nas pessoas uma consciência mais correta, justa e, assim, fazer prevalecer a bondade acima de todas as coisas. Eis aí o chamado Pragmatismo, a corrente a qual filiaram o filósofo. Acima de todas as coisas, como Montaigne, Rorty foi um grande humanista que muita falta nos fará. Requiescat in pace.
4 Comments:
Rorty? Nunca vi mais gordo
Oi. Estou de novo aqui (agora virei leitora "fixa"...rs) para dizer, em primeiro lugar que, como sempre, gostei bastante do seu post, e, em segundo, dizer que sábado li uma matéria no jornal "O Globo", falando da morte e um pouco sobre Rorty. E lá tinha também uma entrevista com o Luiz Eduardo Soares que estudou por dois anos com o filósofo.
Transcrevo aqui um fragmento: " Rorty, sempre com sua companheira Mary, cultivava o hábito de enviar dezenas de livros aos amigos pobres da Europa do Leste ou da África, todo mês, às suas próprias custas. Abrigava, por vezes, os estudantes sem recursos em casa. Fazia de suas viagens um meio de incentivar os que lutavam por liberdade e por justiça, escolhendo os convites que mais se adequassem a esses propósitos e jamais aceitava pagamento quando dava palestras em países pobres. (...) Refratário a toda forma de autoritarismo e dogmatismo, recusava os rótulos, sobretudo o de pós-moderno ou relativista, preferindo, provocativamente, identificar-se com a tradição pragmática norte-americana, o que produzia efeito subversivo sobre os mapas filosóficos contemporâneos. Considerava a democracia liberal do tipo social-democrata superior às ditaduras, mas não acreditava que sua escolha pudesse fundamentar-se exclusivamente na razão, com R maiúsculo, porque as razões são cultural e historicamente moldadas. Essa superioridade teria de ser construída na prática do discurso e da política, no sentido de que demonstrá-la deveria constituir um objetivo a atingir e não um pressuposto a descortinar. Nada menos relativista."
P.S.: Espero que não tenha cansado ninguém. Além de mim, é claro. rs.
Mayra, obrigado pela transcrição. Não li essa matéria no "O Globo", mas a entrevista não deixa dúvidas que Rorty era um homem extremamente bom, algo muito difícil de se encontrar.
É verdade. Impressionou-me mais a parte que diz que ele enviava vários livros a amigos pobres seus que não tinham condições de pagar por eles. Realmente tocante.
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